Nada de especial, por Catarina Almeida

Muitas vezes, ao rever fotografias antigas, fico espantada por reparar que os meus pais eram mesmo novos quando eu nasci.

Lá aparecem eles e os amigos, uns cachopos, com filhos e responsabilidades. Depois, começo a comparar: aqui tinham a idade deste, aqui tinham a idade daquele… Invariavelmente, concluo que eram corajosos e destemidos ou, então, muito ingénuos e inconsequentes, por se aventurarem em tais empreitadas com tão poucos “conhecimentos” e “experiência”. Ou as duas coisas.

Hoje em dia, a vida e as suas circunstâncias prestam-se pouco a assumir um protagonismo na vida antes dos 25, 26 anos… Os cursos demoram mais tempo, sair de casa dos pais requer quase poupanças milionárias, conseguir suportar o custo de vida sozinhos ou com um companheiro é tão difícil que os jovens quase desistem antes de tentar. Ter filhos, além disso, exige mudanças tão significativas de hábitos e de disponibilidade de uso do dinheiro e do tempo (para não falar do coração), que está num horizonte cada vez mais longínquo.

Não quero com isto fazer interpretações sociológicas para as quais não estou habilitada. Só queria dizer que compreendo. 

O que eu não compreendo é como é que nunca ouvi os meus pais, nem os amigos deles, queixarem-se de inaptidão ou falta de alguma coisa para ter assumido essa vida logo tão novos. Várias vezes referiram que não foi fácil, que havia pouco dinheiro, restaurantes quase nem vê-los, casas pequenas, roupas herdadas dos primos e tal. E as doenças, as crises, as dúvidas e inquietações? E até mesmo – há que admitir! – as imaturidades? A verdade é que nunca ouvi contar que algum dos problemas fosse esse. Outros houve, mas nunca ouvi contar que não se sentissem capazes ou que faltasse alguma dose de skills de parentalidade. Recorreram aos médicos quando estávamos doentes; recorreram aos pais, avós e irmãos mais velhos quando precisavam de ajuda; na maioria dos outros casos, recorreram à memória de como tinham visto fazer, suponho eu.

E por que motivo me lembrei disto no dia do Pai? Porque acho que cresci a acreditar que, para ser pai e ser mãe, não era preciso nada de especial. Convém que os filhos durmam, comam, brinquem (brinquem muito!), aprendam tudo o que lhes permitir viver e saborear a existência com mais alegria e entusiasmo. E convém que, ao olharem para nós, desejem ser grandes.

Creio que alguns pais de hoje correm o risco de passar tempo demais a olhar para os filhos e à procura das soluções perfeitas para os seus “problemas”, perante os quais se sentem, muitas vezes, frágeis e impotentes. Tenho boas notícias… Os nossos filhos são um mistério que não pode ser explicado pelo conjunto das nossas ações ou omissões e nós temos tudo o que precisamos para os educar; trata-se “apenas” de viver à altura do nosso desejo de coisas grandes, certos de que a existência é uma aventura imensa na qual vale a pena arriscar. E, para isso, não há receitas; só a nossa liberdade cheia de limites e contradições, que cai e se levanta todos os dias com alguma ironia e vontade de recomeçar!

Catarina Almeida