Nem sim nem não, por Catarina Almeida O Pinóquio chegou à Ilha das Abelhas Laboriosas depois de uma noite infernal a nadar em busca do seu pai. Está esfomeado e, apesar de ver as ruas cheias de pessoas atarefadas, decide pedir uns tostõezinhos para comer qualquer coisa. Primeiro encontra o carvoeiro, que se oferece para lhe dar quatro tostões, em troca de ajuda com o carrinho cheio de carvão pesado. O boneco ficou “quase ofendido”. Trabalhar? Nem pensar! Depois, encontra o pedreiro, que o convida a levar a cal com ele, em troca de cinco tostões. Mas a cal é pesada e eu não quero fazer esforços. Ainda passam mais vinte pessoas, mas a decisão estava tomada desde o início: eu não nasci para trabalhar! Ora diz-me cá, querido Pinóquio, então para que nasceste? Esta é a pergunta da vida do boneco. E pode ser a pergunta da nossa vida. O pequeno já tinha dito ao que vinha quando falara com o Grilo Falante, já deixara bem claro que queria subir às árvores e caçar borboletas… Qual escola, qual tarefas, qual trabalho! Nem pensar! Para que nasceste afinal? É o reencontro com a Fada Azul – que não morreu, porque não pode morrer – que vem dar uma resposta surpreendente. Uma boa senhora trazia dois cântaros e, perante o pedido de Pinóquio, deu-lhe de beber, sem pedir nada em troca. E quando o boneco lhe pediu de comer, pediu-lhe uma ajudinha pequenina, levar um dos dois cântaros, porque eram pesados. Tudo muda neste reencontro porque Pinóquio não respondeu nem sim nem não. E a boa mulher continuou: dou-te um bocado de pão. E nem sim nem não. E um prato cheio disto e daquilo. Nem sim nem não. E um bolo cheio de creme! – Que seja! Vou levar o cântaro até à sua casa! Os encontros anteriores estavam marcados pela justiça razoável: a uma tarefa corresponde a justa retribuição, o justo agradecimento. Mas a boa mulher, que tinha cabelos azul cor do céu, dá sem medida. Dá água, dá comida, dá bolos com creme. E continuaria a dar até Pinóquio dizer que sim. Com paciência infinita, ou seja, com amor infinito, a Fada azul sabe que o Pinóquio nasceu para ser amado. Para se reconhecer amado. Por isso, não o mede, não o submete a condições prévias. Ama-o e, por isso, dá sem medida. Depois, começará a educá-lo na consciência de que por sermos amados, temos uma tarefa no mundo. Mas, diante do nem sim, nem não, o primeiro gesto da educação é amar sem pretensões. Catarina Almeida