O encontro (é?) decisivo

O Martim é sempre um molengão a almoçar. Todos os dias chego ao refeitório e lá está ele. Carrancudo quando cruza o olhar com os adultos, fiteiro quando é interpelado. Dói a barriga, não gosta de arroz (nem de massa, nem de batatas, nem de nada que me lembre assim de repente…), não tem fome.
No meio das tentativas de superar este drama alimentar, vamos tentando de uma forma e outra, divididas entre os critérios ideais que conhecemos e as contingências do dia-a-dia de uma escola. É preciso comer e rápido! porque há sestas e limpezas e actividades. E a vida é assim.
Ontem fui ter com o Martim, ele começou a tremelicar os olhos porque achou que ia levar (mais) um ralhete. E ia. Só que, de repente, pensei melhor.
– Martim, queres vir almoçar para o pé de mim?
– Pode ser… – respondeu ele, contrariado.
– Não é castigo, é para te fazer companhia.
Ele animou-se, veio a correr, sentou-se e… não, não tem happy ending e não acabou de almoçar num abrir e fechar de olhos. Lá limpou o prato – a custo. Lá engoliu a fruta – a custo.
A custo mas na companhia de alguém que almoça com ele, partilha com ele a dificuldade do almoço, ouve as suas queixas (“eu não gosto mesmo de almoçar!”), as aceita, tenta mostrar que não se pode deter na queixa (“claro, eu já percebi, mas precisamos de comida para ser fortes e blá blá blá)…
E a vida é assim. Uns dias saltamos de alegria, outros dias molengamos e fazemos fita.
A diferença de potencial está mesmo na pedagogia do encontro, naquela misteriosa experiência de ser abraçados e amados sem que o drama (alimentar, claro) desapareça mas se torne ocasião de nos deixarmos encontrar.

Catarina Almeida