Rosas, rugidos e garras, por Catarina Almeida

A visão e o odor das rosas lembraram ao mercador a promessa que tinha feito a Bela. Esticou-se para apanhar uma rosa e, ao fazê-lo, ouviu-se um estremecer e um restolhar e, de entre os canteiros de rosas, surgiu um enorme Monstro, como o mercador jamais havia visto. 

in A Bela e o Monstro

Clássicos dos Contos de Fadas
Porto, Ed. AMBAR, 1996

Quem se lembra do velho mercador que partiu em busca de uma fortuna que acabou por se revelar inexistente?  É o pai da protagonista de “A Bela e o Monstro”. Duas das suas filhas imploraram por riquezas e preciosidades. A mais nova, Bela, pediu apenas uma rosa.

Foi nessa atribulada viagem que, no meio de peripécias fantásticas e misteriosas, o mercador encontrou um palácio rodeado de jardins maravilhosos. Tudo era esplêndido… mas sem sinais de vida. Num desses jardins, havia um caramanchão de rosas e foi o cheiro e a beleza dessas rosas que recordou ao mercador a promessa feita à filha… Foram também esse cheiro e essa beleza a força impulsionadora daquela mão esticada que provocou os rugidos de um Monstro assustador.

É como na nossa vida: quantas vezes nos deixamos conquistar pela beleza de um canteiro de rosas, e de lá sai um enorme Monstro, que jamais havíamos visto…?

Naquele restolho começa a grande história de entrega e amor da filha Bela que irá viver com o Monstro para salvar o pai. Por este pobre mercador ter tirado a coisa que o Monstro mais amava, também terá de entregar alguma coisa preciosa.

Esta história que conheço desde pequena e que vive na minha infância com a banda sonora em sotaque do Brasil tem sido um desafio. Desde logo, porque aquela visão e aquele odor de rosas, que foi sinal de um Bem imenso, ou seja, da promessa feita à filha, trouxe imediatamente consigo a pele áspera e as garras ameaçadoras do Monstro. Nem sempre a realidade se nos apresenta com doçura e atractividade. Mas será sempre sinal. De quê?

Além disso, que ousadia, a do Monstro! Cortaste o meu amor, a minha rosa, desenraizaste-a. Só poderás “salvar-te” com outro amor igual e, por isso, dás-me em troca a tua amada filha. A Fera assustadora vocifera em altos brados e obriga-nos a pensar quais são as nossas rosas, quais são os nossos tesouros.

É que as rosas são sinal de outra coisa: da promessa feita à Bela, do coração do Monstro. Será que a Bela vai aceitar esta realidade como sinal e abraçar até rugidos e garras ferozes? E nós?

Que saudades tinha eu de uma boa história… O que acontecerá até ao derradeiro final desta história de Amor?

Catarina Almeida