Será que vale a pena estarmos sempre assim, à procura de alguém?

As ruas estavam cheias de gente e Oriana sentiu-se muito perdida e muito tonta no meio de tantas casas, de tanto barulho, de tanta agitação. Olhava por todos os lados à procura de alguém que a pudesse ajudar. Mas só via desconhecidos, que passavam sem sequer a ver.
Resolveu perguntar ao sinaleiro:
– Diga-me, se faz favor, senhor sinaleiro conhece um moleiro que veio da floresta e que tem onze filhos?
– Nesta cidade há um milhão de pessoas e eu não conheço moleiros. Siga, siga, está a interromper o trânsito! 

in A Fada Oriana, Sophia de Mello Breyner Andresen

Siga, siga, está a interromper o trânsito!… Quantas vezes nos sentimos como Oriana, muito perdidos e muito tontos, no meio de (des)conhecidos para quem somos um entre um milhão de pessoas? E quantas vezes somos o senhor sinaleiro – preocupados apenas com o trânsito que deve correr assim tal e qual – sem conhecermos os moleiros da nossa vida?

Oriana ia à procura de alguém que a pudesse ajudar porque sabia que a cidade não era como a sua floresta, onde ela conhecia cada recanto, onde as árvores a acolhiam e os pássaros lhe sorriam. Tantas vezes me sinto como Oriana, como se pertencesse a outra floresta. E na cidade – que é a nossa vida terrena – preciso de alguém que me ajude. Sozinhos deixamo-nos confundir pelo barulho e pela agitação.

Será que vale a pena estarmos sempre assim, à procura de alguém? Alguém que nos ajude a caminhar, que nos faça companhia, que saiba onde estão o moleiro, o lenhador e o Poeta? Oriana encontra o gato, que sabe onde está o moleiro e depois encontra o cão, que sabe onde mora o lenhador. O problema de Oriana não fica resolvido porque a mulher do moleiro não acredita em Oriana a menos que lhe devolva o filho, e a mulher do lenhador pede-lhe que vá buscar o marido à prisão. Há muito por resolver ainda, há muito mal por redimir e, para isso, há o tempo. A verdade é que Oriana encontra sempre quem lhe dê uma ajuda: o gato, o cão, a árvore…
Quando estamos perdidos, o que nos salva é procurar Alguém que nos faz voltar a caminhar porque então tudo se transforma em ocasião para nos salvar do nosso reflexo e da nossa pouquidão.

Catarina Almeida