Sim, aqui é como no Presépio No chão, os galhos secos estalavam sob os passos, a brisa murmurava entre as árvores e os grandes mantos bordados dos três reis do Oriente brilhavam entre as sombras verdes, roxas e azuis. Já quase no fundo dos pinhais viram ao longe uma claridade. E sobre essa claridade a estrela parou. E continuaram a caminhar. Até que chegaram ao lugar onde a estrela tinha parado e Joana viu um casebre sem porta. Mas não viu escuridão, nem sombra, nem tristeza. Pois o casebre estava cheio de claridade, porque o brilho dos anjos o iluminava. E Joana viu o seu amigo Manuel. Estava deitado nas palhas entre a vaca e o burro e dormia sorrindo. Em sua roda, ajoelhados no ar, estavam os anjos. O seu corpo não tinha nenhum peso e era feito de luz sem nenhuma sombra. E com as mãos postas os anjos rezavam ajoelhados no ar. Era assim, à luz dos anjos, o Natal de Manuel. — Ah — disse Joana — aqui é como no presépio! — Sim — disse o rei Baltasar — aqui é como no presépio. Então Joana ajoelhou-se e poisou no chão os seus presentes. in A Noite de Natal, Sophia de Mello Breyner Andresen ——- Chegamos ao fim d’A Noite de Natal. Caminhar para o Presépio com a Joana e o Manuel foi uma descoberta contínua de luzes e sombras que habitualmente ficam esquecidas entre os afazeres e as preocupações. Entre os pinhais, Joana encontrou misteriosamente os Reis que viajavam de longe para trazer as suas riquezas àquele garoto vestido de remendos cujos olhos brilhavam como duas estrelas. Juntos chegaram a um lugar cheio de claridade e encontraram o Manuel, deitado nas palhas e cujo corpo era feito de luz sem nenhuma sombra. Era como no Presépio. Era como aquela gruta onde há dois mil anos, o Menino Jesus nascia e trazia ao mundo aquela Luz sem sombras que nunca mais se apagou. A experiência do Natal coincide, para mim, com a aventura da Joana. É um encontro integralmente humano porque exalta toda a humanidade da Joana – o coração que pula na garganta, o amigo que oferece uma companhia, que traz paz e frescura, que desvenda as sombras e encoraja passos inimagináveis. E é um encontro integralmente divino porque o coração alcança certeza, porque a companhia rasga a nossa medida, porque a paz vence o medo e porque a Luz não cessa de brilhar no nosso caminho. Seja este Natal para todos, como para a Joana, ocasião de nos ajoelharmos e poisar no chão os presentes que queremos oferecer a Jesus, para que Ele os transforme em dons para a vida dos que amamos e do mundo inteiro. Catarina Almeida