Temos medo que nos fritem…

A Menina do Mar é uma história simples e conta o encontro entre um rapazito da terra e uma menina do mar.

Tudo começa numa praia onde o rapazito estava feliz e onde passava os dias a brincar. Ele adorava as rochas, as algas, a maresia e a água transparente. “O rapazinho sentia-se tão feliz que às vezes punha-se a dançar em cima dos rochedos.”.

Certo dia, ouviu uma gargalhada muito esquisita e foi ver o que passava. Encontrou um grupo muito curioso: um polvo, um caranguejo, um peixe e uma menina que não devia medir mais que um palmo de altura… Cantavam e dançavam e estavam divertidíssimos. Na manhã seguinte, correu a procurá-los e não resistiu mais: a curiosidade levou-o agarrar a pequena menina que ficou aflita por achar que o rapazinho lhe queria fazer mal.

Não te quero fritar nem te quero fazer mal nenhum. Só te quero ver bem, porque nunca na minha vida vi uma menina tão pequena e tão bonita. E quero que me contes quem tu és, como é que vives, o que é que fazes aqui no mar e como é que te chamas.

Então ela parou de gritar, limpou as lágrimas, penteou e alisou os cabelos com os dedos das mãos a fazerem de pente, e disse:

– Vamos sentar-nos os dois naquele rochedo e eu conto-te tudo.

– Prometes que não foges?

– Prometo.

(in A Menina do Mar, Sophia de Mello Breyner)

A Menina morreu de medo quando foi agarrada mas o rapazinho só queria vê-la bem, que a Menina contasse quem é, como vive e o que faz no mar. A Menina aceitou este desafio e prometeu não fugir. Veremos mais à frente que não será simples. (Nunca é…).

O rapazinho sentia-se feliz na sua praia e a menina estava alegre com os seus amigos. Só que o imprevisto que tantas vezes caracteriza a existência vem baralhar tudo e faz acontecer uma coisa inesperada. Um encontro com alguém que nos faz ficar curiosos desencadeia uma experiência de descoberta apaixonada. Apaixonada porque faz vibrar o nosso ser; não será fácil nem isento de dificuldades, de aparentes contradições e de momentos dramáticos.

Esta história vai ajudar-nos a olhar com mais simplicidade para os que amamos. No fundo, temos medo que nos fritem… Somos diferentes, uns dos mar, outros da terra; uns moram em casas brancas, outros no fundo do mar… Depois do momento inicial de curiosidade sobre o outro, veremos que o Rapazito e a Menina têm muito que descobrir. E que o mais importante é serem fiéis a este primeiro passo: que ele não a frite e que ela não fuja. Quando tudo se tornar mais árido, só essa promessa poderá manter vivo aquele desejo de ir ao encontro do outro…

Catarina Almeida