Um horizonte mais amplo, por Catarina Almeida Estava a preparar a apresentação (já se inscreveu?), quando ouvi a seguinte frase “as coisas estão feitas à medida das crianças, temos de lhes dar um horizonte mais amplo”! A Mafalda referia-se aos parques infantis, aos brinquedos, aos programas de televisão e aos tablets, isto é, a uma infinita panóplia de “interlocutores” das crianças que estão feitos para responder milimetricamente ao que a criança precisa e é capaz. Tive uma epifania! Belíssima pista de trabalho! A Mafalda estava a referir-se especificamente ao desenvolvimento psicomotor, tão comprometido nos últimos anos, por muitas razões diferentes, mas ao mesmo tempo tão importante de salvaguardar e promover. Eu considero que ela está totalmente correcta e que o trabalho que temos desenvolvido no CENTRO [MAIS] tem feito caminho nessa direcção, mas há uma questão de fundo que tornou mais claro o critério educativo fundamental. Lembrei-me de um exemplo um bocado tonto e que tem a ver com… meias até ao joelho. Quando eu era pequena, nós vestíamos saias com meias até ao joelho, com frio ou sem frio. Às vezes também nos punham collants, claro, mas outras vezes rapávamos um griso descomunal porque… era dia de meias até ao joelho. Claro que ninguém o fazia para nos fazer sofrer, mas era assim. Aposto até que não havia nenhuma teoria sobre as meias e os collants, que não era assunto, mas a questão era prévia. Era um critério de fundo sobre o que faz crescer uma criança. As coisas – a roupa, os brinquedos, os programas, as refeições, enfim… as coisas! – não estavam pensadas à medida das crianças e do seu conforto. As coisas tinham – e têm! – a capacidade de desafiar, de solicitar as crianças, de forma a puxar por elas, literalmente fazê-las… crescer. Tornar-se grandes. Obviamente o exemplo das meias vale o que vale mas a questão fundamental consiste em “dar-lhes um horizonte mais amplo”, como dizia a Mafalda. Como? Não se trata de ser espartanos ou exigentes, nem de dar uma educação estóica, mas de criar ocasiões de encontrar o mundo tal como ele se nos apresenta. Como ele é. O mundo que nos rodeia é maior que nós e os livros, os jogos, os programas e até a roupa podem contribuir para que a relação com o mundo tenha sempre um horizonte maior que o meu próprio umbigo. Penso que o segredo está em termos nós um horizonte mais amplo, isto é, que as crianças nos vejam a contemplar um horizonte que nos desafia e puxa por nós, sem reduzirmos o alcance da vida e do seu significado. Com 8 anos ou com 80 anos, todos desejamos um horizonte mais amplo. Catarina Almeida