Um imprevisto é a única esperança

[…] até na monotonia de certos dias sempre iguais está escondido um mistério de graça.

Todas as semanas leio uma história aos miúdos e depois conversamos sobre o tema. Esta semana tive uma ideia. Antes de ler a história, que eles não conheciam, pedi a cada um para desenhar um objecto, uma pessoa, um animal, aparentemente ao calhas. Eram tudo elementos da história que lhes ia contar a seguir. Quando terminaram de desenhar, comecei então a contar e, à medida que identificavam o seu “elemento”, vinham ter comigo para compormos visualmente a história.

Nunca estiveram com tanta atenção. Pus-me a pensar porquê… Penso que a resposta é simples: tinham na mão alguma coisa concreta; não sabiam para que servia mas sabiam – tinham a certeza – que fazia parte daquela história, que tinha um lugar naquela história e que esse mistério se ia revelar à medida que eu a fosse contando.

Naquilo que eu tinha para lhes propor, estava escondido um mistério que eles queriam ver desvendado. É assim também connosco, na monotonia dos dias… O que nos prende, o que nos agarra, o que nos mantém atentos e entusiasmados, é a certeza que esse mistério se vai revelar.

Esse entusiasmo é exactamente o desejo de encontrar o mistério de graça que se esconde hoje, no bocadinho da história que nos foi distribuído e que ainda não sabemos para que serve. Só por um imprevisto encontraremos o entusiasmo hoje – porque os dias são monótonos e todos iguais… E, na verdade, um imprevisto é a única esperança (Eugenio Montale).

Catarina Almeida