Vale a pena ser professor hoje?

No outro dia, uma pessoa que optou por um percurso profissional muito afastado da educação, dizia-me:

– Sempre quis ser professora, mas as circunstâncias foram-me levando para outros caminhos. Ainda assim, todos os anos, em dezembro, quando faço um balanço e alguns projetos para o ano seguinte, penso que se calhar ainda poderia tentar. Ainda não desisti.

Perguntei-lhe porquê. Respondeu-me sem hesitações:

– A minha professora primária marcou-me muito. Foi das pessoas mais importantes que encontrei na vida e gostava de ser como ela.

Esta conversa aconteceu ao mesmo tempo em que nos debatemos com a árdua tarefa de recrutar professores. Há poucos, e os poucos que há, muitas vezes procuram outras oportunidades. Porque será e o que se pode fazer? O que nos diferencia dos professores que nos marcaram ao longo da vida?

A situação é complexa e as soluções simplistas são insuficientes: são carreiras mal pagas, os contextos escolares são cada vez mais adversos, as exigências de formação são desadequadas e os mecanismos estão obsoletos… Tudo isto tem alguma coisa de verdadeiro, mas não pode ser apenas um problema do sistema.

Há pelo menos dois aspectos que têm um impacto mais ou menos visível e que precisam de ser discutidos.

Por um lado, é fundamental interrogarmo-nos sobre a missão do professor em pleno século XXI. A inteligência artificial traz inovações e possibilidades de acesso à informação e ao conhecimento que nunca tinham sido sequer pensadas. A visão do professor-conhecedor foi superada e não colhe em nenhum âmbito. Qualquer aluno pode saber factos, fórmulas e técnicas em pouco tempo e com bons resultados, prescindindo de um professor. Pode até compreender nexos e significados com um alcance louvável, na medida em que as ferramentas tecnológicas conseguem perfeitamente dialogar com as suas aprendizagens anteriores e lançá-lo para o futuro.

Por outro lado, um certo esvaziamento dos currículos e dos essenciais da educação para a lógica das competências, das atitudes e dos valores, tendem a dar espaço a outros protagonistas sociais e a “desescolarizar” a sociedade, por se ter em vista mais a formação de cidadãos do que propriamente homens cultos e de ciência.

Se assim é, vale a pena ser professor hoje? Diz Hannah Arendt que a educação é o ponto em que decidimos se amamos o mundo o bastante para assumirmos a responsabilidade por ele.

Vale a pena, hoje, assumir a responsabilidade pela escola e pelo ensino? Amamos alguma coisa que nos impele a chegar até esse ponto de consciência?

O amor pelas novas gerações só pode nascer de uma gratidão por alguma coisa que já vivemos; a educação é sempre uma superabundância do presente, por uma professora primária que nos marcou.

São estas as pistas para o diálogo Vale a pena ser professor hoje?, no próximo dia 27 de novembro, às 19h, na Fundação Maria Ulrich. Venha conversar connosco.

Catarina Almeida